Até os anos 1980, no Brasil, os cães eram relegados aos quintais e suas atividades se resumiam basicamente a cuidar da casa. Apesar da interação com os donos, pouca gente prestava atenção às necessidades destes pets, além de alimento (quase sempre restos de comida) e água. Hoje, sabe-se que os cães têm sentimentos e conseguem expressá-los. Cães choram, riem e expressam tudo o que estão sentindo.
Só não o fazem como nós, pelo simples fato de que a espécie (Canis lupus familiaris) não apresenta secreções lacrimais. É uma questão anatômica. Mas nossos “melhores amigos” possuem uma grande capacidade de percepção: eles choram por sentimentos próprios e também porque conseguem perceber as sensações e emoções dos demais membros da família e até mesmo de pessoas estranhas.
Os cães também não se lamentam, nem soluçam. Este é um comportamento desenvolvido pela humanidade – quanto mais “expressivo” é o choro, mais realidade existe nas suas raízes. Para citar um exemplo, durante muito tempo, nós contratamos carpideiras para chorar em funerais. A profissão existe há mais de dois mil anos.
É o famoso chororô, o pranto acompanhado por lamentos, lamúrias, reclamações. Gilberto Gil já cantou sobre isto, lembrando: “mas se uma pessoa chora o pranto em desatino, batendo pino como que vai se arrebentar…”. Os cães são mais sinceros: o choro não precisa se transformar em espetáculo.
Razões diferentes
Nós, seres humanos, choramos porque sentimos dor ou em função de alguma perda: a tristeza nos leva ao choro. Os cães também choram por estes motivos, mas eles vão além: o choro é mais uma forma de comunicação, utilizada também pelos bebês, que igualmente ainda não conseguem expressar-se de outro modo.
Filhotes e adultos também choram quando sentem medo. Isto pode ocorrer em diversas situações:
• quando ouvem barulhos estranhos, a que não estão acostumados (pode ser o som de buzinas, os passos de um vizinho no corredor, etc.);
• quando são introduzidos em ambientes estranhos (um hotelzinho para cães, uma clínica veterinária e até a casa de praia onde a família passa férias);
• quando sentem fome (isto pode ocorrer quando cães obesos são a restrições alimentares). Muitos pets, no entanto, aprender a mexer nas tigelas de água e ração para chamar a atenção dos tutores;
• quando se sentem sozinhos. Isto pode acontecer não apenas quando os tutores saem de casa, mas também quando os pets são deixados isolados no quintal, por exemplo. É importante lembrar que, para eles, nós fazemos parte da matilha e, portanto, é necessário dedicar um tempinho diário para ficar com eles;
• quando sentem alguma dor ou desconforto. É necessário ficar atento aos sinais. Por exemplo, se um cão muito agitado mostra-se apático e chora, está na hora de consultar o veterinário.
Os filhotes caninos choram mais. Eles “abrem o berreiro” pelos motivos comuns dos nenês: fome, frio, necessidade de companhia. Quando são desmamados, choram por sentir falta da mãe. Nesta última situação, eles podem varar a madrugada com ganidos.
No entanto, é fácil corrigir este comportamento. As ninhadas costumam se aconchegar – quando estão dormindo, parece um “bolo de filhotinhos”. Ao chegarem à nova casa, uma providência simples pode garantir o silêncio durante quase toda a noite. Basta providenciar um cobertor enrolado, ou mesmo um bichinho de pelúcia, para que eles tenham a sensação de que não estão sozinhos. Simples assim.
Este comportamento é chamado “imprinting” pelos especialistas. Traduzindo do inglês, “imprinting” significa marca, impressão. No caso dos cães e outros animais, trata-se de primeira impressão positiva que marca a vida dos filhotes – no caso dos cães, quase sempre, esta impressão é a mãe e os cuidados maternos.
O imprinting tende a permanecer, porque ele se configura como uma imagem de segurança, afeto e apoio. O próprio instinto de sobrevivência faz com que os filhotes se apeguem a esta impressão. No entanto, o imprinting pode ser transferido: qualquer pessoa que trate do pet e dê carinho a ele poderá suceder a mãe cadela nestas primeiras impressões.
Manipulação
Os cães podem chorar em uma tentativa de manipular os tutores. Na verdade, este não é um comportamento “de caso pensado”: os pets não fazem isto por maldade ou malícia. Nossos amigos de quatro patas apresentam uma grande capacidade de associação.
Ao exibir determinado comportamento e sentir-se recompensado por ele, o cãozinho tende a repeti-lo em outras situações. Se ele receber atenção, carinho, afeto e alimento todas as vezes que chorar, é fácil entender que ele rapidamente se transformará em um exímio “chorão”.
Aqui, entra a necessidade do treinamento de obediência. É muito difícil resistir aos apelos de um cachorro, especialmente quando estes são acompanhados por um choro “de cortar o coração”. No entanto, para o bem deles, é necessário ser assertivo na educação canina. Ao perceber a manipulação, os tutores devem permanecer firmes e não ceder às “chantagens” dos pets. No médio prazo, isto os tornará mais felizes e equilibrados e a família poderá contar com muitos momentos de alegria e descontração.
Os uivos
Apesar de parecerem verdadeiros lamentos, ao menos aos ouvidos humanos, os uivos quase nunca têm algo a ver com o choro. Certamente, observar um cão uivando em uma noite de lua cheia quase sempre parece traduzir melancolia e tristeza.
Não é necessariamente assim. Na natureza, os lobos, que permanecem em silêncio durante quase o dia inteiro, uivam à noite. Aos olhos menos atentos, eles parecem se isolar para praticar este “ritual”. O que acontece é exatamente o contrário.
Os uivos também são utilizados pelas cadelas quando elas estão no cio; portanto, quando estão receptivas a receber os machos. Uma vez que os controles humanos são mais raros durante a noite, é mais comum que elas chamem “os namorados” neste período do dia. Nestes casos, cria-se uma sinfonia: a cadela chama, os machos respondem em uma verdadeira reação em cadeia.
Nas alcateias, os animais uivam para se comunicar com outros membros. Como a vocalização é única (dois lobos nunca uivam de forma idêntica), o ruído serve para encontrar colegas afastados e também para indicar a própria localização.
Por que a lua cheia? Porque os lobos não costumam se afastar do grupo nas noites mais escuras. Nas noites de lua cheia, eles podem explorar os arredores e, como são animais gregários, não deixam de se comunicar para indicar onde estão e também para avisar sobre algo estranho ou incomum.
O imaginário humano criou as lendas de lobisomens e outros seres “do mal” uivando vagando pelas noites de lua cheia. O mito passou para a literatura e o cinema: o som passou a ser associado a algo lúgubre ou a maus presságios. Mas, cães e lobos não têm nada a ver com isto.