A parceria já é antiga. Descubra por que o cachorro é realmente o melhor amigo do homem.
Tudo começou há muito tempo. Para ser mais exato, na última Era do Gelo, que se encerrou 12 mil anos atrás. Humanos e canídeos (lobos, na verdade) passaram a colaborar na caça, que estava rara naquela época. Assim surgiu a parceria e o cachorro se tornou o melhor amigo do homem.
Existem provas: por exemplo, em 2019, foram encontrados os restos bem preservados de um filhote de cachorro na Sibéria. O animal, enterrado com objetos e comida, lembra um husky siberiano dos dias de hoje.
A datação por radiocarbono constatou que o pet viveu há 18 mil anos. O animal, que tem traços genéticos de cachorro e lobo, foi batizado de Dogor, que significa “amigo” em iacuto, o idioma falado na República de Sakha, nordeste da Rússia.
Entre nós
Os brasileiros também se renderam à personalidade canina. Além do desenvolvimento de raças caninas nacionais, um levantamento realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2013 constatou que mais de 52 milhões de cães viviam nos lares do país (naquele ano, o total de peludos ultrapassou o número de crianças até 12 anos, que era de 45 milhões).
Os melhores amigos do homem definitivamente são a preferência nacional. Ainda de acordo com o IBGE, eles podem ser encontrados em mais de 37 milhões de residências; os pássaros domésticos são 40 milhões e os gatos, que obtiveram a “medalha de bronze”, estão presentes em menos de 20% dos lares, totalizando 24 milhões de pets.
As raças brasileiras são as seguintes (apenas o fila e o terrier já contam com reconhecimento internacional):
- boca-preta sertanejo (cão sertanejo);
- buldogue campeiro;
- buldogue serrano;
- dogue brasileiro;
- fila brasileiro;
- griffon barbudo;
- ovelheiro gaúcho;
- pastor da Mantiqueira;
- terrier brasileiro (fox paulistinha);
- veadeiro pampeano.
Os motivos
As razões para os cachorros serem os melhores amigos do homem são muitas, e ninguém melhor do que os tutores para conhecê-las e descrevê-las. Isto não é apenas impressão: com o correr dos milênios, os cães passaram a apresentar traços marcantes de personalidade, que não são encontradas em outras espécies – pelo menos, não com a mesma intensidade.
Cada cachorro é único e desenvolve as características próprias a partir da convivência com os tutores. Mesmo os animais adotados já adultos se adaptam à família humana, extrapolando algumas qualidades e reprimindo outras.
Para quem não está acostumado a conviver com um cachorro, isto pode soar exagerado, mas os cães têm sentimentos complexos e são capazes de demonstrá-los. Eles sentem medo, raiva, tristeza e são capazes de estabelecer relacionamentos de amizade e de amor.
As reações neurais dos cachorros já foram mensuradas em muitos estudos, inclusive com a colaboração de adestradores – para que eles ficassem quietos em um exame de imagem, como uma tomografia computadorizada, por exemplo.
Os estímulos cerebrais dos peludos são muito semelhantes aos apresentados pelos humanos, especialmente nas questões relacionadas ao mecanismo de recompensa. Todas as vezes em que nós (e os cachorros) são recompensados (como um carinho, uma massagem relaxante, uma brincadeira, etc.), algumas áreas do córtex cerebral são ativadas.
Nos experimentos, as regiões cerebrais dos cães relacionadas às recompensas são ativadas rapidamente quando ouvem a voz dos tutores, veem a sua imagem (mesmo em uma fotografia) ou sentem o cheiro.
Os cachorros passaram a associar humanos a coisas boas. Certamente, eles passam por maus bocados com alguns humanos, mas as experiências prazerosas foram mais frequentes e contribuíram para definir a estrutura emocional dos pets.
A inteligência canina
A capacidade cognitiva desenvolveu-se em paralelo com a história da humanidade. Gradualmente, os cães aprenderam o significado das nossas palavras, da nossa linguagem corporal e sabem se comunicar conosco.
Até mesmo alguns gestos caninos, como inclinar a cabeça e suspender as sobrancelhas, são características copiadas a partir da observação das atitudes humanas. Entre os lobos, a comunicação é bastante sofisticada, mas a inteligência canina se desenvolveu para permitir a troca de informações entre duas espécies diferentes.
Eles também aprenderam a “dar um jeitinho”. Um estudo da Universidade de Viena (Áustria) de 2016 demonstrou que os cães tendem a ser mais obedientes quando estão sendo observados pelos seus tutores. Quando estes estão distraídos com o trabalho, a TV ou uma leitura, os peludos encontram formas de burlar as regras.
Os cachorros são capazes de estabelecer relações de amizade e, por isso, os relacionamentos dos pets varia em relação a cada membro da família humana. Eles sabem com quem podem brincar com mais intensidade, quem gosta de lambidas, quem oferece cafunés com mais frequência.
Eles também são capazes de sentir empatia: ao perceber uma pessoa triste ou enfraquecida, os cachorros se posicionam ao lado e permanecem “sendo solidários” por todo o tempo necessário. Uma prova da devoção e fidelidade dos peludos.
A evolução
Existem evidências da parceria entre humanos e caninos nos últimos 33 mil anos: fósseis, desenhos em paredes de cavernas, etc. Os cães domesticados, escolhidos entre lobos selvagens (potencialmente predadores do próprio homem), nunca mais deixariam a convivência: definitivamente, eles se tornaram os nossos melhores amigos e conquistaram o nosso coração.
Enquanto a humanidade moderna se espalhava pelo planeta, os cachorros acompanharam os deslocamentos. Por isso, Homo sapiens e Canis lupus familiaris são as duas únicas espécies animais que podem ser encontradas em qualquer latitude e longitude.
A teoria mais aceita até hoje é que os nossos cachorros descendem de lobos que se aventuraram por acampamentos de caça, em busca de restos de alimentos. A presença foi estimulada pelos humanos, que passaram a aproveitar a parceria na caça e na defesa.
A aparência dos animais ancestrais começou a evoluir. Algumas características impressionaram positivamente os homens pré-históricos: os cães desenvolveram cabeças menores, olhos e orelhas caídos e mantinham a cauda abaixo da linha do tronco, passando impressão de fragilidade e dependência.
Os cães que conviviam conosco nessa época eram semelhantes aos filhotes, carentes e nada ameaçadores. Além disso, o temperamento progressivamente foi atenuado, com a redução das características violentas e agressivas.
Um novo estudo, no entanto, aponta razões diferentes: os cães teriam propositalmente procurado a companhia humana. Eles não desenvolveram habilidades sociais com o contato: foram estas habilidades já presentes que proporcionaram o relacionamento. Trata-se de uma programação existente nos genes da espécie.
A influência genética
Um estudo da Universidade de Oregon (EUA), publicado em 2017 da revista Science Advances, identificou nos nossos peludos dois genes associados a uma doença rara entre humanos: a síndrome de Williams-Beuren (SWB). A incidência fica entre um entre cada 13,7 mil e 25 mil bebês nascidos.
Os sintomas da SWB, considerada o “oposto do autismo”, é o comportamento hipersocial. As pessoas nesta condição tendem a ser altamente extrovertidas, comunicativas, solidárias, capazes de estabelecer contato visual prolongado, mas também apresentam forte tendência à ansiedade. Esta poderia ser uma descrição dos nossos melhores amigos.
O estudo indica que os cães dos nossos ancestrais não eram mais dóceis e amigáveis, com uma forma de cognição social mais bem elaborada do que a de seus primos selvagens. A condição genética pode levar a uma motivação exagerada para buscar o contato social.
A pesquisa envolveu inicialmente 18 cachorros, alguns de raça pura e outros sem raça definida, comparados com 18 lobos criados em cativeiro. Todos os cachorros apresentam a mutação genética e mostraram-se muito mais amistosos nas interações com humanos, mesmo com alguns desconhecidos.