Mulher negligente é proibida de adotar novos cães

Constatados os maus tratos, esta tutora negligente foi proibida de manter novos cães em casa.

“Dura lex, sed lex”. A expressão latina, que pode ser traduzida como “a lei é dura, mas é a lei”, afirma que as normas sociais devem ser cumpridas, mesmo quando são drásticas e rigorosas. Uma tutora britânica foi proibida de adotar e manter novos cães, depois de comprovada a negligência e os maus tratos.

A legislação é semelhante à brasileira, que pode ser considerada ainda mais contundente. Por aqui, maus tratos, negligência e abandono de animais – cachorros entre eles – podem ser punidos com multas e penas de reclusão de até cinco anos.

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O crime

A Royal Society for The Prevention of Cruelty to Animals (RSPCA) recebeu denúncias, em 2022, sobre uma moradora de Bridgwater, em Somerset, no sudoeste da Inglaterra. De acordo com as denúncias, a britânica era negligente com os seus cachorros, expondo-os a situações perigosas, insalubres e degradantes.

Uma equipe da ONG se deslocou até a residência de Susan Boobyer, onde foi constatada a negligência. A britânica mantinha os cachorros em gaiolas durante a maior parte do tempo, sem alimento nem água.

Os cães também não tinham qualquer tipo de proteção contra o frio, não se exercitavam nem eram estimulados com brincadeiras e adestramentos. Com o avanço das investigações, alguns vizinhos de Boobyer afirmaram que a situação se repetiu durante mais de 15 anos, com diferentes animais de estimação.

As equipes da RSPCA se revezaram nas visitas e nos aconselhamentos à mulher de 52 anos. A tutora, no entanto, ignorou os avisos reiterados para que oferecesse melhores condições para os cachorros com quem vivia.

Uma inspetora da ONG, Jo Daniel, responsável pela investigação, conseguiu convencer a tutora a deixá-la levar dois dos cachorros, Rex e Suzie, ao veterinário, depois de diversas orientações para que ela cuidasse da saúde dos animais.

O profissional de saúde constatou o óbvio: Rex e Suzie estavam desnutridos, com problemas na pele e nas orelhas, dificuldades de locomoção em função do longo tempo presos nas gaiolas e profundamente deprimidos. Os dois peludos não retornaram à casa de Boobyer.

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No consultório, o comportamento dos cachorros revelou a sequência cotidiana de negligência e maus tratos. Rex e Suzie se atiraram avidamente às tigelas de água e ração, demonstrando carências acumuladas por longo tempo.

Daniel informou à polícia sobre os maus tratos. A antiga tutora também foi comunicada de que os dois cães não voltariam para casa e ela deveria providenciar condições dignas para os animais que ainda estavam sob sua guarda.

Boobyer ignorou os avisos. Em nova visita domiciliar, Daniel, com ajuda de oficiais da polícia inglesa, conseguiu identificar mais vítimas: Foxy e dois filhotes, com cerca de dez semanas de vida, estavam presos em um cômodo repleto de urina e fezes.

Os três animais foram apreendidos. Levados ao veterinário, constatou-se que os filhotes estavam muito abaixo do peso e que Foxy apresentava descoloração na pelagem, indicando alergias provavelmente causadas por pulgas e outros parasitas.

A equipe da RSPCA voltou a casa de Boobyer, que aparentemente estava tentando esconder os animais que ainda viviam lá. Foram encontrados dois outros filhotes, Annie e Bella (mais tarde, verificou-se que as cachorrinhas são filhas de Suzie, apreendida anteriormente).

As últimas duas cachorras resgatadas exibiam costelas salientes, demonstrando alto grau de desnutrição. Annie e Bella também tinham escaras na pele, provocadas pela permanência nas gaiolas, mesmo quando estavam sujas de excrementos.

A pena

Os cachorros foram retirados da casa de Boobyer imediatamente. Rex, Suzie, Foxy, Bella e Annie foram transferidos para um canil mantido pela RSPCA, para tratamento e posterior adoção. Teve início, então, a investigação policial propriamente dita.

Evidentemente, Susan Boobyer sofre com transtornos emocionais. A britânica vive sozinha em um casarão em Bridgwater. Suspeita-se que ela sofra de disposofobia, condição patológica caracterizada pela aquisição e acumulação compulsivas de objetos, muitas vezes em condições perigosas e insalubres.

Mesmo assim, a mulher foi considerada responsável pelas más condições a que submeteu os cachorros e também por ignorar as advertências da RSPCA: Boobyer foi considerada reincidente, não podendo alegar que ignorava as normas de bem-estar animal.

Em fevereiro de 2023, a inglesa foi condenada, pelo Tribunal de Magistrados de Somerset, a um ano de reclusão, suspensa automaticamente e substituída por prestação de serviços comunitários. Ela também recebeu multas que somaram 756 libras esterlinas (pouco mais de R$ 4.800, pela cotação atual) pelos custos do processo.

A pena de reclusão foi suspensa por dois anos a contar da sentença, mas poderá ser aplicada, caso Boobyer sofrer novas condenações. A inglesa também foi proibida de adotar cachorros durante os próximos 15 anos.

A RSPCA

A RSPCA é uma associação não governamental presente na Inglaterra e no País de Gales que tem como objetivo promover o bem-estar dos animais. A entidade investiga anualmente centenas de queixas de crueldade e negligência, especialmente em relação a cães e gatos.

A ONG também resgata animais domésticos e de estimação encontrados em situação de abandono e maus tratos, providenciando o tratamento necessário e encaminhando-os para a adoção sempre que possível.

Fundada em 1824, a RSPCA é a organização de defesa dos direitos dos animais mais antiga do mundo. Em 2020, a ONG mantinha 1.500 empregados fixos e contava com a colaboração de mais de 6.600 voluntários.

A lei brasileira

A legislação brasileira sobre maus tratos e negligência contra animais silvestres, domésticos e de estimação é antiga. A Lei dos Crimes Ambientais (lei nº 9.605/1998) já previa penas de reclusão, pagamento de multas e proibição de adoção para pessoas condenadas. Mesmo assim, ela se tornou mais rígida a partir de 2020.

De acordo com a legislação anterior, os maus tratos contra animais eram considerados “de menor potencial ofensivo” e a reclusão prevista para os crimes era de um a três anos, convertida em prestação de serviços comunitários (no caso de réus primários, sem condenação judicial anterior).

A lei nº 14.064/2020 alterou a redação da Lei dos Crimes Ambientais e tornou as penas mais duras. Ela recebeu o nome de Lei Sansão, uma homenagem ao pitbull que, no início de 2020, teve as patas traseiras decepadas em uma oficina mecânica em Confins, região metropolitana de Belo Horizonte.

No caso de maus tratos contra cães e gatos, a pena de reclusão, a partir da nova redação, passou a ser de dois a cinco anos, não podendo mais ser convertida em prestação de serviços ou pagamento de cestas básicas, mas podendo ser cumprida em regime semiaberto.

Os autores dos atos de negligência (que inclui abandono, maus tratos, morte acidental e dolosa, não satisfação das necessidades básicas, etc.) também estão sujeitos ao pagamento de multas e à proibição de adotar novos animais de estimação.

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