Todos os dias, independente das condições climáticas, uma cachorra deixava o conforto de casa para esperar a tutora, Lesley, na volta do trabalho. Ela se tornou tão conhecida que, quando subiu para o céu dos cachorros, praticamente toda a população da cidade fez questão de celebrar a vida desta peluda.
Coley, uma border collie que morou a vida inteira no País de Gales, uma das nações que compõem o Reino Unido, demonstrou a sua lealdade durante os 11 anos de convivência com a família Owen. Dócil e carinhosa, ela também fazia sucesso entre os alunos da escola de Ammanford, uma pequena cidade de apenas 7.500 habitantes.
A história de Coley
A border collie foi um presente de aniversário para Phil Owen, o marido de Lesley, que adquiriu a cachorra. A grande paixão, no entanto, sempre foi a melhor amiga, a quem Coley dedicou lealdade incondicional.
A peluda acostumou-se a sair diariamente de casa, com Phil, para esperar a tutora em um banco no ponto de ônibus em Penybanc, o bairro tranquilo em que a família mora. Ela sabia o horário exato do reencontro e nada a convencia de percorrer o curto trajeto para aguardar a volta de Lesley.
O tempo em Ammanford é bastante instável. As nevascas no inverno são praticamente diárias e, mesmo no verão, a temperatura no cair da tarde fica em torno de 18°C. As chuvas são igualmente constantes, especialmente de março a dezembro.
Mesmo assim, Coley nunca faltou ao encontro diário com Lesley. À reportagem do Wales Online, Phil contou que a cachorra começava a ficar inquieta por volta das 16h. Pouco depois, pegava a guia e sentava-se à porta, pronta para seguir para o ponto de ônibus.
A border collie acabou se tornando uma referência no bairro. As crianças, ao saírem da escola, faziam questão de passar pelo banco para brincar alguns minutos com Coley. Mesmo as que usam transporte escolar festejavam a presença da peluda, “conversando” com ela enquanto os condutores tentavam, sem muito sucesso, fazer os estudantes ficarem sentados em seus bancos.
Até mesmo os motoristas de táxi conheciam a história da border collie. Os endereços da avenida que corta o bairro eram conhecidos como “antes ou depois do banco da Coley”. Os carros passavam buzinando para cumprimentar a cachorra.
Apesar da lendária pontualidade britânica, Lesley não tem um horário fixo para chegar em casa. Ela deixa o trabalho entre 17h e 18h, mas Coley nunca pareceu se importar. Mesmo com chuva, frio ou escuridão (no inverno, o sol se põe por volta das 16h30mim no País de Gales), ela sempre se manteve firme, esperando a tutora.
A morte e as homenagens
Em julho, em pleno verão, chegou a hora de Coley se despedir definitivamente da família. Ela tinha 11 anos. Certa tarde, a border collie não apareceu no ponto de ônibus. Todos os vizinhos ficaram imediatamente alarmados.
A presença de Coley era, de certa forma, uma garantia de conforto e segurança para todos que a conheciam. Mesmo sob péssimas condições climáticas, vê-la esperando a tutora era uma forma de reconforto, uma prova de amizade incondicional e desinteressada.
A notícia surpreendeu a todos. As crianças da escola ficaram inconformadas. Pedestres e motoristas interromperam seus trajetos para tentar entender a ausência de Coley.
Um menino de oito anos, após saber da morte da border collie quando estava saindo da escola, pediu à mãe para ir até a floricultura – e mostrou o dinheiro que tinha no bolso. Ele comprou um pequeno buquê e depositou-o no “banco da Coley”.
Isto parece ter sido a senha para que todos, em Panybanc, dessem início às homenagens póstumas. O banco ficou repleto de flores, cartazes e brinquedos. Poucos dias depois, os vizinhos se cotizaram para personalizar o banco, que agora ostenta, nas laterais e no encosto, o nome da cachorra, que se tornou “uma lenda de Ammanford”.
Um cartaz acompanha a homenagem. Nele, pode-se ler: “Coley, a collie, dava as boas vindas para cada um de nós. Ela trouxe alegria e nos fez sorrir. Nunca será esquecida”. O letreiro está escrito em inglês e em galês.
Muitas homenagens
Coley não é a primeira cachorra a ser homenageada por sua lealdade e amizade. O exemplo mais notável certamente é o do akita Hachiko, que continuou esperando o tutor morto durante quase dez anos, em uma estação de trem no Japão.
Outro cão galês que ficou famoso é Jack, de Swansea, no sul do país, que viveu entre 1930 e 1937. O terra nova passou a vida na costa do País de Gales, junto à foz do rio Tawe, e sempre atendia aos pedidos de socorro. Ele salvou do afogamento nada menos do que 27 pessoas.
Greyfriars Bobby também é bretão, mas nasceu e viveu na Escócia, em Edimburgo. Bobby guardou a sepultura do melhor amigo, o policial John Grey por 14 anos, até a própria morte. O skye terrier conviveu com o tutor por apenas dois anos. Ele não deixava o cemitério de Greyfriars Kirkyard nem mesmo para se alimentar.
O policial morreu em 1858. Em 1867, Bobby continuava rondando o cemitério e autoridades locais decidiram sacrificá-lo, por ser “um cão sem dono”. Ao saber da notícia, um arquiteto bastante conhecido, William Chambers, pagou, do próprio bolso, a licença para o cachorro não ser abatido. O skye terrier viveu ainda cinco anos, sempre ao lado do melhor amigo.
Ainda nas ilhas gregas, há uma lenda no século 13 sobre mais um cachorro fiel: Gelert (a primeira citação é de 1258). Certo dia, o tutor, príncipe Llewelyn (de um feudo no norte do País de Gales), saiu para caçar e deixou Gelert cuidando da casa.
Ao retornar para o castelo, o nobre encontrou a cama do filho vazia. O animal estava coberto de sangue. Sem pensar duas vezes, o nobre apunhalou o cachorro, acreditando que ele tivesse atacado a criança.
Instantes depois, a criança foi encontrada sã e salva, ao lado de um lobo, morto durante uma briga terrível. Ficou claro que Gelert havia avançado sobre a fera, para salvar o menino. Diz-se que Llewelyn nunca mais sorriu.
Por coincidência, este é o sobrenome de solteira de Lesley Owen, a tutora de Coley. A suposta sepultura do cachorro guardião pode ser visitada em Snowdonia, uma região montanhosa no norte do País de Gales, em uma comunidade chamada Bedgelert – o mesmo nome do herói da lenda.
Ammanford é conhecida pela mineração de carvão, pelo grande número de habitantes que falam galês (o maior na Grã-Bretanha) e por ser a terra natal do ator John Rhys Davies (que interpretou o anão Gimli, personagem da trilogia “O Senhor dos Anéis”). Agora, é também famosa por ser “a terra de Coley, a collie”.