O beagle é um hound (sabujo ou rastreador) e exibe todas as características dos hounds ingleses: é curioso, ansioso e incansável. A raça provavelmente surgiu a partir do foxhound, mas se tornou menor e mais gregária: estes cães adoram viver em grandes grupos.
Os cães da raça são robustos e compactos. Apesar de resistente e rústico, o beagle não dá a impressão de ser um cão grosseiro: pelo contrário, ele é muito atraente e elegante, mas está sempre em atividade, em busca de novidades para farejar e perseguir.
A origem da raça beagle
Quando os romanos invadiram a Bretanha, em 55 AEC, já encontraram cães semelhantes ao beagle: quadrados (com altura semelhante a medida do comprimento do tronco), coloridos, de pelo curto, muito ativos, ágeis e rápidos, conforme relatos dos guerreiros liderados pelo general Júlio César.
Na corte do rei inglês Henrique 8º (1491-1547), os caçadores eram acompanhados por beagles de pelo duro, alguns pequenos o suficiente para serem carregados em bolsas de caça. O porte menor foi obtido para a caça a pé de coelhos e lebres, mas em pouco tempo eles se especializaram em um esporte britânico tradicional (e sangrento): a caça à raposa.
Os modernos beagles surgiram por volta de 1830, a partir de cruzamentos seletivos entre algumas raças populares na época. Os seguintes cães contribuíram para o desenvolvimento do beagle com exceção do harrier, todos já estão extintos):
- o talbot, um cão branco esgalgado, de pernas curtas e pés achatados, orelhas caídas e cauda longa e enrolada;
- o northern hound, predominantemente branco, lento – para caça a pé –, ossudo e de cabeça quadrada;
- o southern hound, grande e alto, com peito profundo, corpo alongado, cabeça quadrada e orelhas compridas;
- o harrier, em tudo semelhante ao beagle, mas maior e mais pesado.
O beagle pesa de 9 kg a 11 kg e mede de 36 cm a 41 cm (as fêmeas são menores). O harrier, ainda popular na Inglaterra e Escócia, pode pesar até 30 kg, com altura alcançando 61 cm.
Curiosidades sobre a raça
O beagle é um cão de matilha, muito atlético e sempre pronto para farejar e perseguir rastros. A disposição para conviver em grupo e colaborar é talvez o principal motivo para a popularidade da raça. Ele é retratado em pinturas pelo menos desde a Era Elisabetana e foi escolhido como mascote de diversas universidades britânicas e americanas.
01. A origem da palavra
Não se sabe ao certo como surgiu o termo “beagle”, mas os linguistas apostam em duas possibilidades. Uma delas é uma palavra semelhante entre os celtas (que viveram onde hoje são a França e a Inglaterra), que significa “pequeno”. Isto pode demonstrar a antiguidade da raça (ou, pelo menos, do tipo).
O outro termo parecido vem do francês arcaico e significa “boca alta”, uma provável alusão ao barulho provocado pelos beagles, principalmente quando eles estão atuando em matilha. Muito mais tarde, no século 19, um canal entre as ilhas da Terra do Fogo (extremo sul da América do Sul) recebeu o nome Beagle, ao ser cruzado, em uma viagem de circum-navegação, por um navio homônimo. Um dos passageiros mais ilustres era o naturalista Charles Darwin, consultor científico da tripulação. Darwin propôs a teoria da evolução através da seleção natural das espécies.
02. A personalidade
Os beagles são sociáveis, muito ativos e dóceis com humanos de todas as idades. Por serem cães de matilha, eles perseguem as presas silenciosamente, mas fazem muito barulho quando descobrem um rastro, para alertar os companheiros. Em casa, eles repetem o comportamento e são companheiros muito “falantes”.
03. Cobaias de laboratório
Por causa da docilidade, mas também das semelhanças anatômicas com os humanos, especialmente no que diz respeito à pele, os cães da raça são muito empregados para experimentos que colaboram com a indústria: principalmente alimentos, produtos de higiene e cosméticos. Há diversos movimentos que querem proibir o uso de beagles como cobaias.
04. Silenciando beagles
Por serem muito expressivos e comunicativos (e barulhentos), os beagles também foram objetos de pesquisas visando encontrar procedimentos para silenciar pets. Estima-se que, nos EUA, 70 mil cães da raça tenham sido usados em laboratório.
No Brasil, o Instituto Royal ocupou as manchetes há dez anos, quando ativistas invadiram o laboratório da empresa em São Roque (SP) para resgatar centenas de cães (beagles, na maioria). Uma das atividades estava relacionada a cordectomia (mutilação das cordas vocais, para reduzir os latidos). 20 dias depois dos protestos, o laboratório foi desativado.
Em tempo: no Brasil, a cordectomia em cães é proibida por lei, assim como caudectomia (amputação da cauda), conchectomia (amputação das orelhas) por motivos meramente estéticos, assim como a onicectomia (retirada cirúrgica das garras, mais comum em gatos).
05. Cães de bolso
Pelo que é possível observar em pinturas do século 15, os pocket beagles (beagles de bolso) eram relativamente comuns: eles inclusive seriam os prediletos da rainha Elizabeth 1ª, da Inglaterra e Escócia, filha e sucessora de Henrique 8º.
Há relatos de que os cães menores eram mais eficientes nas caçadas, mas, na época, ninguém se interessava por cruzamentos seletivos, que só começaram a ser entendidos completamente no século 19, com o avanço da genética.
Mas ainda é possível encontrar beagles minúsculos em diversas ninhadas. O porte pequeno está associado a um gene recessivo, mas, quando ele está presente no pai e na mãe, os filhotes podem apresentar a característica. Atualmente, alguns criadores vêm tentando fixar definitivamente o beagle miniatura, como uma variedade da raça.
É muito provável que os beagles do início da Idade Moderna europeia fossem todos muito pequenos. O tamanho atual foi atingido apenas no século 19, através do cruzamento com terriers de maior porte. Atualmente, os “nanicos” que nascem espontaneamente, se formassem uma raça separada, seria a menor do mundo canino: abaixo dos 25 cm de altura.
06. Tentativas de alterações genéticas
Além da redução do tamanho, alguns criadores vêm fazendo cruzamentos em busca de novas raças. O mais promissor, no momento, é um híbrido de beagles e coonhounds, duas raças britânicas de caça. A pelagem é quase sempre tricolor, as orelhas são menores e os focinhos, mais alongados do que as de um beagle puro.
Nos EUA, algumas experiências envolvem cruzamentos com boston terriers, ainda sem resultados consistentes, com chihuahuas (os cheagles) e com dálmatas. Este último cruzamento tem gerado filhotes muito parecidos com o harrier. Há ainda tentativas de hibridismo com pastores alemães, pit bulls e basset hounds, sem resultados expressivos.
07. As cores do beagle
A alegria dos beagles se manifesta também nas diferentes pelagens, que revelam uma explosão de cores. Alguns são totalmente brancos (mas não são albinos), mas a maioria é formada por cães bicolores e tricolores, em combinações de branco, preto, castanho, cor de texugo (cinza e preto), cor de lebre (castanho amarelado), vermelho (ruivo ou fígado), azul (cinza azulado) e limão (branco esverdeado, mais frequente nos cães miniatura; é a cor mais rara).
Todas as cores podem se combinar, inclusive formando manchas mosqueadas (com fios de cores diferentes formando manchas). Apesar desta aparente “democracia” capilar, o padrão oficial é rígido em um ponto: a extremidade da cauda é sempre branca. O motivo é que os caçadores identificavam os cães em movimento nos campos visualizando a ponta do rabo.
08. Olfato poderoso
Todos os cães se destacam pelo faro apurado, mas o beagle é considerado um dos melhores rastreadores. Ele é empregado inclusive para identificar mercadorias contrabandeadas: não apenas drogas, mas qualquer substância que deva ser barrada na alfândega, inclusive alimentos.
Os cães da raça possuem 300 milhões de receptores olfativos no focinho, cerca de 50 vezes o número encontrado em humanos (a média canina é de 220 milhões). Além disso, a área cerebral responsável por processar os odores é 40 vezes maior do que a nossa. As orelhas caídas junto às faces ajudam a concentrar os cheiros.
09. Número 1 em rastreio
O beagle não tem o hábito de procurar rastros farejando o ar, motivo por que é preterido nas buscas de pessoas perdidas em montanhas e terrenos acidentados, por exemplo. No solo, no entanto, ele é o melhor rastreador, capaz de encontrar o “alvo” em uma área de meio hectare em menos de um minuto.
Experimentos sobre o assunto têm sido realizados desde os anos 1950. Em uma análise em campo no norte da Inglaterra, em 1952, cães da raça conseguiram encontrar um rato em poucos segundos. O rough collie, o segundo colocado, precisou de 12 minutos para localizar o mesmo alvo, em condições idênticas.
10. Teste de gravidez
Em 2013, um beagle foi treinado para diagnosticar gravidez em ursas-polares. O experimento ocorreu no zoológico de Cincinnati (Ohio, EUA). O cão Elvis foi apresentado a amostras de fezes de 17 ursas, inclusive de Berit, residente do zoo.
Ainda hoje, não existem testes de laboratório para detectar a gestação em ursas-polares. A espécie está em extinção e a reprodução em cativeiro e problemática, com elevado número de abortos espontâneos. A detecção precoce aumenta as chances de êxito.
O detalhe é que Elvis nunca teve contato com animais do Ártico, nunca procurou rastros na região. O treinamento foi realizado com os excrementos de animais machos, filhotes, fêmeas no cio, grávidas confirmadas e lactantes. O beagle “analisou” detidamente as fezes das gestantes, mas ignorou rapidamente as demais amostras, especialmente aos dos machos.
Elvis, que tinha dois anos na época dos testes e ainda está vivo e ativo, foi capaz de identificar a gravidez em cinco fêmeas, como 100% de acertos e nenhum erro. Até hoje, os cientistas ainda não conseguiram isolar as substâncias identificadas pelo beagle com tanta precisão.
11. Miss e Mister Simpatia
O beagle é um cachorro extremamente simpático. Ele não deve ser adotado para guarda porque, além do porte pequeno, é amigável com todos, estranhos e conhecidos. Talvez a atenção excessiva do beagle seja um pouco cansativa para pessoas mais contemplativas e tranquilas.
Outro risco é em espaços públicos. Para um beagle, todos são amigos. Isto pode facilitar eventuais furtos, mas o maior perigo está em outros cães, que podem entender a agitação dos cães da raça é um convite para a briga. Um gato querendo tirar um cochilo também não se incomoda em usar as garras para “acalmar” um beagle.
12. A fama
O beagle mais famoso da história é Snoopy, o filosófico animal de estimação de Charlie Brown, da turma dos Peanuts, criado por Charles Schulz em 1950. Os quadrinhos são publicados até hoje. Snoopy (que deveria se chamar Sniffy), era inicialmente um personagem mudo e andava sobre quatro patas, mas rapidamente adquiriu características antropomórficas, interagindo com toda a turma.
No cinema, a aparição mais recente de um beagle aconteceu em 2016, em “As Aventuras de Ozzy” (Espanha), de Nacho La Casa e Alberto Rodriguez. Na trama, Ozzy é deixado em um hotel para cães que, na verdade, é uma armadilha para roubar pets. O beagle e seus amigos se envolvem em diversas aventuras, até o retorno dos tutores.
“Vira-Lata”, de 2007 (Studios Disney, EUA), com roteiro e direção de Frederik Du Chal, um beagle chamado Engraxate sofre um acidente durante um experimento científico e adquire superpoderes, tornando o Underdog (nome original do longa-metragem). Este desenho animado é baseado em uma série de TV transmitida nos EUA de 1964 e 1973. O mote do herói ficou famoso: “There’s no need to fear, Underdog is here”.
Em “Shiloh”, de 1997 (EUA), escrito e dirigido por Dale Rosenbloom, um beagle toma uma decisão radical e foge de casa, escapando dos maus tratos do tutor. Ele encontra um menino, Marty, que resolve adotá-lo, mas o pai não permite, por saber que ele pertence a um caçador cruel. Shiloh é devolvido, volta a ser maltratado e Marty sai em seu socorro.
Entre 1989 e 2008, Wallace e Gromit protagonizaram cinco filmes (quatro curtas e um longa-metragem). A franquia, criada pelo cineasta britânico Nick Park, envolve as trapalhadas de um inventor e seu fiel escudeiro, o beagle Gromit. Os personagens são modelados com massinha e filmados em stop motion.
Em “O Cão e a Raposa”, de 1981 (Studios Disney, EUA), dirigido por Ted Berman, Art Stevens e Richard Rich, é apresentada a amizade improvável entre um beagle e a sua presa principal. Dodô é uma raposinha adotada depois da morte da mãe em uma caçada e conhece Toby, que se torna guardião da filhote.
Os cuidados com um beagle
• O beagle é considerado um cachorro hipoalergênico: ele perde poucos pelos e não há uma época do ano específica para a troca. Escovar a pelagem uma vez por semana é suficiente para manter a boa aparência. Os pelos são curtos, brilhantes e assentados.
• A escovação dos pelos tem outras funções. Ela estimula a produção das glândulas sebáceas, garantindo a oleosidade natural necessária para o brilho da pelagem. Garante igualmente a proteção contra umidade excessiva e permite o controle da temperatura corporal.
• As orelhas, por outro lado, podem ser o ponto fraco. Grandes e caídas, elas são excelentes locais para acumular umidade, tornando-se ideais para a proliferação de bactérias. A raça é bastante suscetível a otites e precisam ser inspecionadas e limpas diariamente.
• As doenças oftalmológicas – catarata, atrofia progressiva da retina e glaucoma, por exemplo – também são relativamente frequentes. Entre as alergias mais comuns, destacam-se os casos de dermatite atópica e sarna demodécica, um tipo transmitido de mãe para filho no parto e amamentação. Ela se manifesta quando a imunidade cai por qualquer motivo.
• A síndrome Musladin-Lueke afeta com tanta intensidade os cães da raça que também é conhecida como síndrome da dor do beagle. É uma condição genética que afeta a medula espinhal e causa fibrose e dor na pele e nas articulações. A doença pode se manifestar ainda na infância e exige acompanhamento médico pela vida inteira.
• Estes cães conseguem brincar sozinhos, encontrando rastros e pistas. Mas não se pode esquecer que eles fazem parte de uma raça gregária, extremamente sociável. Por isso, eles apreciam bastante a companhia dos tutores. A presença de crianças, para um beagle, é motivo de festa para eles.
• São também cães de trabalho, que já percorreram longas distâncias em busca de presas. Os tutores devem estar preparados para longas caminhadas diárias, independentemente das condições climáticas. O beagle, aliás, é muito resistente às alterações de temperatura.
• Os cães da raça preferem o trote ao galope, mas não recusam uma boa corrida de curta distância – há vários beagles campeões em provas oficiais. Ele também é destaque em competições de porte e postura, rastreio e obediência.
• O adestramento, aliás, é muito útil para manter os beagles ocupados e satisfeitos, prevenindo o isolamento, o tédio e as consequências: sem nada para fazer, ele pode se tornar destrutivo, mas o risco maior é desenvolver depressão.
• Com tanta inteligência e independência, o beagle também pode ser considerado um pouco teimoso. O treinamento inicial, com a apresentação das regras da família e os comandos básicos, deve começar logo no primeiro dia da convivência, para que o filhote se adapte à nova rotina.
Um último cuidado, mas desta vez relacionado aos tutores: o beagle é um dos campeões na exibição de “olhos pidões”. Quando ele quer alguma coisa, pode passar longos minutos encarando a família, com um ar desprotegido e carente. É preciso cuidado, especialmente em relação aos petiscos, que os cães da raça adoram.