Como cuidar de um cachorro com cinomose

A cinomose é perigosa e pode matar. Confira como cuidar de um cachorro com a doença.

Cinomose é uma doença infectocontagiosa que afeta cães de todos os portes e raças, inclusive mestiços. Ela não é transmissível para humanos, outros pets e animais domésticos (aves de granja, vacas, porcos, carneiros, etc.), mas já foi identificada em outros canídeos (lobos, raposas e nos brasileiros lobos-guarás e cachorros-vinagre) e guaxinins norte-americanos.

O tratamento da cinomose quase sempre exige internação hospitalar. Por isso, o cuidado principal dos tutores é estar atento aos primeiros sinais: diarreia aguda, perda rápida de peso e, nos filhotes, comprometimento sensível do desenvolvimento físico.

A transmissão da cinomose

A cinomose é uma infecção viral, transmitida através do contato com secreções de animais contaminados por vírus do gênero Morbillivirus, como as fezes, a urina, a saliva, secreções oculares e nasais, etc. Ela afeta principalmente os cães filhotes e jovens, mas pode se manifestar em qualquer idade.

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Enquanto ainda recebem leite, os cães recém-nascidos são protegidos pelos anticorpos da mãe. As infecções ocorrem depois das seis primeiras semanas de vida, em animais não imunizados. Os cachorros adultos saudáveis quase sempre já têm um sistema imunológico capaz de neutralizar a replicação (multiplicação) dos vírus.

Os Morbillivirus são bastante resistentes. Além do contato direto com secreções, um cachorro pode se infectar ao compartilhar caminhas, roupas, cobertores, comedouros e bebedouros com outros peludos contaminados.

A replicação dos vírus

Os vírus não são considerados seres vivos: eles são classificados como seres acelulares. Uma das justificativas para isso é que um vírus não tem autonomia para se reproduzir: ele se replica “capturando” o DNA de uma célula, que pode ser animal, vegetal ou até mesmo de um fungo ou bactéria.

Naturalmente, a célula invadida perde as funções quase imediatamente e morre pouco depois, mas o intervalo é suficiente para o surgimento de diversas cópias do vírus, que, por sua vez, procurarão outras células para invadir e usar o DNA.

Em qualquer tipo de infecção, o sistema imunológico percebe a presença dos invasores – que podem ser bactérias, fungos ou vírus – e dá início ao combate. As infecções classificadas como “benignas” são aquelas em que o organismo consegue neutralizar a ameaça.

A evolução da cinomose

O sistema digestório, na imensa maioria dos casos de cinomose, é o primeiro a ser atingido. Por isso, diarreias e vômitos são as primeiras manifestações. As fezes expelidas podem apresentar traços de sangue, muco ou aspecto oleoso.

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Dois ou três dias depois, com os sintomas cada vez mais intensos, o sistema respiratório também é afetado e o cachorro sofre com tosse, espirros, coriza, perda rápida do fôlego. Nesta etapa, é comum observar a presença de secreções amareladas nos olhos e nas narinas.

Na terceira fase, quando os vírus atingem o Sistema Nervoso Central (SNC) surgem os comprometimentos neurológicos. Os cachorros afetados apresentam desorientação espacial (podem começar a cair ou a andar em círculos, por exemplo), redução do tônus muscular (com tremores ou tensão e rigidez), convulsões, desmaios e paralisias.

Em geral, os veterinários recomendam a eutanásia antes da intensificação dos sintomas neurológicos, para evitar um sofrimento desnecessário. Mas, caso o cachorro seja mantido vivo, ele também passa apresentar problemas cutâneos, como pápulas (lesões sólidas na pele) e pústulas (pápulas com pus, um indicativo do agravamento da infecção).

Na sequência, um cachorro com cinomose apresenta os seguintes sintomas:

  • vômitos;
  • diarreias (inclusive com a presença de sangue);
  • perda de apetite;
  • dores abdominais;
  • tosse, que pode ser seca ou com secreção;
  • secreção nasal;
  • dificuldade para respirar;
  • secreções nasais e oculares;
  • febre;
  • pneumonia;
  • perda da coordenação motora;
  • dificuldade de orientação espacial;
  • movimento de “pedaladas” com as pernas dianteiras;
  • tremores;
  • •paralisia;
  • nistagmo (movimentos involuntários dos olhos);
  • lesões na retina, no cristalino e na conjuntiva;
  • lesões de pele;
  • coma.

Como cuidar da cinomose?

A cinomose é fatal na imensa maioria dos casos. As mortes são praticamente certas quando a doença acomete filhotes, idosos, convalescentes de traumas ou doenças ou portadores de transtornos crônicos. Mas, com o tratamento adequado, os cães adultos saudáveis podem superar a cinomose.

As curas dos cães muito jovens, os velhinhos e os imunossuprimidos por qualquer motivo são as exceções que servem para comprovar a regra. E, mesmo quando é possível vencer a cinomose, a maioria dos sobreviventes desenvolve sequelas, como insuficiências cardíacas e respiratórias, dermatites de difícil controle ou deficiências neurológicas que prejudicam a locomoção e até mesmo a respiração.

Até pouco tempo atrás, acreditava-se que a fase neurológica da doença era um efeito da infecção, que gerava uma reação autoimune. Uma vez que era possível observar o declínio dos sintomas digestórios e respiratórios em paralelo ao avanço do quadro doloroso, os veterinários trabalhavam com a hipótese de que o organismo canino era capaz de neutralizar e superar os vírus, mas ao custo de uma resposta autoimune em que as células de defesa passavam a atacar o SNC, gerando desordens neurológicas fatais.

Sabe-se atualmente que os macrófagos (um tipo de células de defesa) combatem apenas os neurônios afetados pelos Morbillivirus: eles estão exercendo a função correta (isolar e eliminar células com traços do vírus), mas em ritmo insuficiente para eliminar a infecção antes que o SNC fique inapelavelmente comprometido.

Hoje em dia, sabe-se que o diagnóstico de cinomose precisa ser obtido o mais precocemente possível e os sintomas respiratórios e digestórios combatidos rapidamente, já que os mesmos vírus afetam diversos tecidos do organismo canino.

Mas o diagnóstico precoce esbarra em outro problema: sintomas como diarreia, vômito, tosse e febre quase sempre são negligenciados pelos tutores, mesmo porque são sinais muito difusos, que podem ser confundidos com os de outras doenças e até mesmo com o desconforto depois de um exagero alimentar.

Os tutores conhecem profundamente os seus cachorros e são os mais indicados para perceber que alguma coisa está errada: pode ser a diarreia muito fétida, a perda de fôlego, a apatia e o desinteresse. Todos esses são sinais difusos, mas podem revelar bastante para quem sabe exatamente quais são as características de personalidade dos peludos.

Portanto, ao identificar “alguma coisa errada”, é importante levar o cachorro ao veterinário, principalmente no caso de animais jovens não vacinados. O profissional é capaz de firmar o dar início ao tratamento antes mesmo de positivada a infecção.

A cinomose foi descrita pela primeira vez na Inglaterra, em 1760. Em 1806, o geneticista franco-inglês Edward Jenner, o mesmo que produziu a primeira vacina contra a varíola, publicou seis estudos sobre a evolução da doença, cujo vírus foi isolado e identificado apenas cem anos depois, por cientistas do Instituto Louis Pasteur, de Paris (França).

Mesmo assim, ainda não foram desenvolvidos antivirais específicos para combater o vírus da cinomose, também conhecido como CDV (canine distemper virus, ou vírus da cinomose canina). O vírus sofre mutações contínuas, de forma semelhante ao que acontece com o Influenza, vírus da gripe humana. Também por isso, em ambos os casos, a imunização precisa ser renovada anualmente.

Em função da inexistência de medicamentos para inviabilizar os vírus, cuidar de um cachorro com cinomose consiste basicamente em atenuar os sintomas, manter o cachorro nutrido e hidratado. Na maioria dos casos, os pacientes precisam de:

  • antieméticos, para reduzis as náuseas e vômitos;
  • antitérmicos, para baixar a temperatura corporal;
  • pomadas e cremes para aplicar nas lesões cutâneas;
  • analgésicos, para aliviar as dores e desconfortos;
  • anticonvulsivantes, na fase neurológica da doença.

Em casos de febre muito alta, pode ser necessário ter que banhar o cachorro em água quase fria, ou envolvê-lo em lençóis umedecidos com álcool. Os procedimentos são simples, mas o ideal é que sejam feitos por profissionais de enfermagem. Nas etapas mais críticas, o papel dos tutores é praticamente o de coadjuvantes.

Uma vez que, em casos de cinomose, o sistema imunológico fica bastante debilitado, quase todos os cachorros afetados precisam também de antibióticos, para combater infecções oportunistas. Em geral, são usados medicamentos de largo espectro, que atuam contra diversos micro-organismos.

Enquanto o cachorro tiver diarreias e vômitos, deve ser mantido sob fluidoterapia, para a reposição de líquidos e de eletrólitos – vitaminas e sais minerais. O acesso para aplicação do soro precisa ser constantemente higienizado, para evitar inflamações no local, que pode funcionar como porta de entrada para infecções. O paciente deve usar um colar elizabetano durante todo o período do tratamento.

Os sintomas da cinomose se apresentam de sete a dez dias da exposição do cachorro ao vírus. Nos casos de diagnóstico precoce, firmado ainda na etapa dos sinais gastrointestinais, o sucesso terapêutico atinge até 70% dos animais afetados. Infelizmente, este percentual é reduzido para menos da metade, quando se trata de cães com menos de seis meses de idade.

Mitos e verdades

  • Praticamente todos os cães expostos são infectados. Os adultos saudáveis, entre um e seis anos, podem não desenvolver os sintomas da cinomose, mas transmitem a doença durante todo o período em que o vírus estiver ativo no organismo: não existe uma etapa ativa de infecção.
  • O diagnóstico preciso depende de exames laboratoriais. Mesmo assim, em casos de suspeita de cinomose, o tratamento deve ser iniciado imediatamente e o cachorro, isolado para evitar novos contágios.
  • Cães de todas as raças, mestiços e sem raça definida (SRD) podem contrair cinomose. A diferença é que os vira-latas são quase sempre mais resistentes, enquanto algumas raças caninas são muito suscetíveis a transtornos digestórios ou cardiorrespiratórios, que tornam os casos mais severos.
  • A cinomose não é apenas uma doença respiratória. A diarreia e o vômito podem se apresentar menos intensos, fato que inclusive ajuda a melhorar a resposta ao tratamento, mas, se o cão não receber tratamento adequado, apresentará os sinais gastrointestinais, cutâneos e neurológicos.
  • A cinomose não é uma zoonose – não é transmissível para humanos. Da mesma forma, não afeta gatos e outros pets. É possível que a doença possa afetar também os furões ou ferrets, que vêm e popularizando como animais de estimação.
  • É verdade que os filhotes são mais suscetíveis às formas mais graves da cinomose, mas isso ocorre apenas porque o sistema imunológico ainda não está plenamente desenvolvido. A resposta das células de defesa pode ser igualmente insuficiente nos cães idosos, portadores de doenças crônicas e convalescentes de traumas.
  • Um mito muito comum é a afirmação de que ovo cru cura a cinomose. Nem o ovo, nem qualquer outro alimento, é capaz de conter a infecção. Além disso, ovos crus, dependendo da procedência, podem causar salmonelose, doença que também pode ser fatal.
  • A cinomose não é uma sentença de morte. Embora a morbidade seja elevada, os cães tratados a tempo podem superar a doença sem nenhuma sequela. Em qualquer caso, eles precisam ser isolados, receber medicamentos, cuidados médicos e de enfermagem.

A prevenção

A cinomose é uma doença com altos percentuais de morbidade – acima dos 70% entre os filhotes, de acordo com estudo de 2017, da Universidade de Wisconsin (EUA). Felizmente, a cinomose é evitável com a aplicação anual da vacina múltipla. no Brasil, os imunizantes mais empregados são o V8 e o V10.

Além de evitar a cinomose, estas vacinas também previnem contra o parvovírus, adenovírus tipos 1 e 2, parainfluenza, coronavírus canino e vários tipos de Leptospira. A diferença é que a V10 protege contra duas outras formas de leptospirose. O veterinário pode indicar a melhor opção, de acordo com a incidência na região.

Nos EUA e na Europa, o imunizante mais usado é o V12, mas é desnecessário no Brasil, porque ele protege contra outros dois tipos de Leptospira que não circulam aqui (ela é indicada apenas para cães que viajam para o hemisfério norte). As três vacinas são aplicadas via injeção intramuscular.

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