A clonagem de animais de estimação está se tornando popular, apesar dos altos custos.
A clonagem de animais, inclusive de estimação, é a produção de indivíduos geneticamente idênticos: o núcleo de uma célula é introduzido em um óvulo previamente colhido, do qual é retirado o próprio núcleo, que contém o DNA: a informação das características genéticas.
Trata-se de um método de reprodução assexuada. As técnicas vêm sendo desenvolvidas desde a década de 1960 e o primeiro experimento bem-sucedido ocorreu em 1996, com o nascimento da ovelha escocesa Dolly, que viveu por seis anos.
A primeira experiência
Os clones são geneticamente idênticos ao indivíduo que doou a célula primordial. No caso de Dolly, foi retirada uma célula da mama de uma ovelha adulta, que doou o núcleo celular (e o DNA), implantado no óvulo de outra ovelha.
Dolly foi o primeiro mamífero a ser clonado com sucesso. A técnica foi batizada como transferência somática de núcleo: espermatozoides e óvulos são células germinativas e todas as demais células nucleadas são somáticas.
O nome da ovelha é uma referência à cantora e atriz americana Dolly Parton, que ficou conhecida também em função das grandes próteses de silicone que usava, já que o clone surgiu de uma célula retirada da mama.
Qualquer célula dotada de núcleo pode ser usada na clonagem. Em 1999, um estudo publicado na revista científica Nature sugeriu que Dolly poderia apresentar tendência ao envelhecimento precoce, uma vez que os seus telômeros (estruturas que formam as extremidades dos cromossomos – as estruturas que contêm o material genético dos organismos) eram mais curtos.
Isto gerou uma polêmica na comunidade científica, até hoje ainda não resolvida, sobre a influência da clonagem nos processos de envelhecimento. Em 2002, quando Dolly já tinha gerado seis filhotes por vias naturais, biólogos da Real Academia Escocesa de Ciências informaram que a ovelha estava sofrendo de uma doença pulmonar progressiva.
O transtorno respiratório está associado ao envelhecimento celular precoce. Dolly foi sacrificada pouco antes de completar sete anos. Seu corpo foi embalsamado e está exposto no Museu Real da Escócia.
A clonagem de Dolly demonstrou que o procedimento era viável. Desde então, muitos outros grandes mamíferos foram clonados, como porcos, touros e carneiros. Os clones gerados foram capazes de produzir descendentes férteis, sempre transferindo as características genéticas do animal original.
No Brasil, o primeiro experimento de clonagem com êxito ocorreu em 2001, quando nasceu a bezerra Vitória, da raça bovina simental. Foi um estudo pioneiro conduzido pela EMBRAPA – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. Desde então, novos clones vêm nascendo a cada ano.
Para que serve a clonagem de animais?
A clonagem de animais de estimação, domésticos e selvagens é uma importante ferramenta para garantir a sobrevivência de espécies em risco de extinção e até mesmo de espécies já extintas, desde que seja possível colher material genético.
Teoricamente, portanto, é possível conduzir experimentos do gênero “Jurassic Park” (filme americano de 1993 que versa sobre a criação de um parque habitado por dinossauros e outros animais já extintos há centenas de milhões de anos).
Oficialmente, no entanto, não há divulgação de nenhum estudo cujo objetivo seja produzir dinos e outros animais pré-históricos. E, apesar de haver notícias esporádicas sobre a clonagem humana, nenhum caso foi cientificamente descrito até hoje.
As principais utilizações da clonagem estão na produção de indivíduos idênticos a animais de grande valor, como vacas leiteiras, resistentes a determinadas doenças genéticas. O mérito das técnicas, portanto, está no melhoramento genético das espécies.
Atualmente, outra técnica de clonagem vem sendo praticada: é a indução da divisão celular. Neste caso, o zigoto (a união entre óvulo e espermatozoide) ocorre in vitro e, nas primeiras etapas da formação do blastocisto (um conjunto de células indiferenciadas que precede o embrião), ocorre a separação de algumas células, formando irmãos gêmeos univitelinos.
A indução, que apenas reproduz o processo natural de gestação gemelar (de gêmeos idênticos) elimina os riscos de envelhecimento precoce, uma vez que a fecundação ocorre a partir de duas células germinativas.
A clonagem de pets
Apesar dos altos custos, a clonagem de pets – cães e gatos principalmente – está se popularizando em diversos países. Três empresas (uma americana, uma sul-coreana e outra chinesa) já oferecem o serviço.
O assunto naturalmente gera muita discussão. Em 2018, a cantora e atriz americana Barbra Streisand contou em uma entrevista que as duas cachorras que viviam com ela, Miss Scarlett e Miss Violet, eram clones de Samantha, uma cadela da raça coton de tulear morta um ano antes, depois de uma convivência de 14 anos com a artista.
A raça coton de tulear, apesar de antiga, é muito rara no Ocidente – este foi um dos motivos que levaram Streisand a recorrer à clonagem de Samantha. A raça é nativa de Madagascar, no sudeste da África.
Durante a entrevista, a artista contou que Scarlett e Violet foram produzidas a partir de células retiradas da boca e do estômago da cachorra falecida. Foram efetuadas seis tentativas frustradas antes da obtenção de embriões que chegaram a termo.
A artista também confessou certo desapontamento. De acordo com Streisand, Scarlett e Violet apresentam personalidades muito diferentes da exibida por Samantha. Além disso, as cachorrinhas têm olhos claros, que não refletem a seriedade e tranquilidade do animal original.
Os prós e contras da clonagem de animais
Pode-se dizer que o principal ponto contrário à clonagem de pets – animais que, em tese, deveriam ser iguais ao original – é o custo. O primeiro experimento ocorreu na Coreia do Sul, na Seoul National University (SNU).
Veterinários da universidade clonaram um afghan hound em 2005. Ele foi chamado de Snuppy, a junção da sigla SNU com a palavra inglesa “puppy” (cachorrinho) – e também uma clara referência a Snoopy, o beagle criado pelo cartunista Charles Schulz.
Snuppy foi produzido a partir de uma célula de um cachorro macho – ele é o primeiro da história e a técnica pode levar a repovoar algumas regiões que lobos e cachorros selvagens ocuparam há alguns milênios.
Uma equipe de 45 geneticistas esteve envolvida na geração do afghan hound. A pesquisa envolveu 123 mães de aluguel. Apenas três embriões foram implantados com sucesso no útero das cadelas e somente Snuppy nasceu e foi amamentado.
A chefe das pesquisas coreanas organizou a primeira empresa para clonagem de pets. Em pouco tempo, ela foi seguida pela chinesa Sinogene (que conseguiu produzir lobos-do-Ártico) e pela americana ViaGen Pets and Equines, que trabalha com cachorros, gatos e cavalos.
Apenas a ViaGen, que também pesquisa a clonagem de furões (ou ferrets, pets bastante populares nos EUA), divulga os valores envolvidos na clonagem de pets: 30 mil dólares para gatos, 50 mil dólares para cães e até 85 mil dólares para cavalos.
A empresa aceita fazer a clonagem de animais de qualquer parte do mundo, mas os interessados precisam se responsabilizar pela retirada das células somáticas que servirão de base para os clones.
Além dos custos, outro ponto contrário é a constatação, nos clones gerados, de que eles são muito diferentes dos animais originais. Desta forma, se a ideia é “ressuscitar” um cachorro ou gato muito amado, as técnicas de clonagem podem não atingir os resultados esperados.
Um clone é uma reprodução geneticamente idêntica ao animal original, mas pode exibir características diferentes, tanto no que se refere à personalidade, quanto a alguns atributos físicos.
Isto ocorre porque os seres vivos não se desenvolvem exclusivamente através das informações transmitidas pelo DNA. Eles também sofrem alterações em função do meio em que vivem e do estilo de vida: intensidade dos exercícios físicos, alimentação, exposição à luz solar, etc.
Este é o motivo por que algumas variedades de carneiros famosos pela lã farta e espessa, ao serem transferidos para outros ambientes, apresentam alterações drásticas: um animal inglês trazido para o Brasil, por exemplo, produziria muito menos lã, porque não precisa se proteger do frio intenso.
O fenótipo – a expressão observável do genótipo, ou carga genética – pode ser bastante diferente, mesmo entre dois gêmeos univitelinos (idênticos). Por isso, os cães clonados podem apresentar diferenças na pelagem e constituição física, apesar de terem a mesma configuração biológica.
A polêmica sobre a clonagem de pets
A questão que mais acirra os ânimos dos contrários à clonagem de pets é justamente o conjunto de diferenças que os clones apresentam em relação aos indivíduos originais. Com relação ao temperamento, eles são absolutamente diferentes.
Pode-se reproduzir um cachorro ou gato muito amado que morreu? Os tutores sabem que, via de regra, os pets vivem menos do que nós e, cedo ou tarde, teremos de nos despedir deles. É a vida que segue.
Ainda existe outro ponto a ser considerado. Seria ético gastar pequenas fortunas, que podem chegar a algumas centenas de milhares de reais, para clonar pets, enquanto milhares de animais estão abandonados nas ruas ou sofrem maus tratos e negligência em diversos pontos do mundo?
Os defensores dos direitos dos animais, em maioria, afirmam que as pesquisas em clonagem devem continuar, inclusive para garantir a manutenção de muitas espécies ameaçadas pelo desmatamento, a destruição dos hábitats e as alterações climáticas.
Com relação à clonagem de animais específicos, por mais adoráveis que eles tenham sido durante a convivência, é preciso lembrar: cães e gatos não “ressuscitam”: a clonagem é um rearranjo celular (e uma grande conquista científica), mas o íntimo dos peludos, quando eles morrem, se esvai com os corpos.